Julho das Pretas: Por Tereza. Por Luana. Por Marielle. Por Dandara. Por todas nós.

Desde 1992, quando foi realizada a primeira edição do histórico Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenha em Santo Domingo, República Dominicana, o dia 25 de julho é marcado como Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha. Na ocasião, o grupo de mulheres que participou do encontro reuniu-se para discutir e pensar maneiras de combater às diversas faces do racismo e do machismo enfrentadas pelas mulheres negras.

No Brasil, o dia 25 de julho é também marcado como o dia de Tereza de Benguela e da mulher Negra. Instituído em 2014 pela Lei n.º 12.987, a data femenageia a líder do quilombo Quariterê que, no século XVIII, tornou-se rainha e por décadas lutou e resistiu à escravização de seu povo. Até o ano de 1770 quando, a mando do Governador da Capitania do Mato Grosso, Quariterê foi invadido e grande parte de sua população massacrada.

Aqui no país também, desde 2013, o Instituto da Mulher Negra – Odara, em conjunto com o movimento de mulheres negras nacional, começou a desenvolver atividades durante o mês de julho com o objetivo de colocar a agenda destas mulheres no centro do debate político. Estas ações, que deram origem ao “Julho das Pretas”, são espalhadas por todo o Brasil e buscam dar enfoque às desigualdades de gênero e raça que ainda atravessam essas mulheres, impedindo-as do acesso a direitos fundamentais.

Este ano, a Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, que compõe as atividades desenvolvidas no Julho das Pretas, ocupará as ruas do centro da cidade “por um Brasil com Democracia. Sem racismo! Sem violências! Sem anistias para os fascistas! Justiça por Marielle e Luana Barbosa! Por nós, por todas nós, pelo bem viver!”. Demonstrando a importância desta ferramenta para a cobrança de um olhar da sociedade e do Estado para as condições de vida (melhor dizer, de não vida) a que a população de mulheres negras ainda é exposta diariamente.

Trazer a falta de justiça e resposta do estado brasileiro para os assassinatos de Marielle Franco e Luana Barbosa demonstra o quão importante, social e politicamente, esse movimento é. E sobretudo, destaca o quão vulnerabilizada ainda é a população de mulheres negras no Brasil. Não importando o cargo ou a posição que ocupem na sociedade. Luana Barbosa, mulher negra, lésbica, periférica, mãe, foi espancada a luz do dia, na presença do filho de 14 anos, por rejeitar ser revistada por três agentes policiais na cidade de Ribeirão Preto. Morreu cinco dias depois, em razão de uma isquemia cerebral e traumatismo craniano, ocasionados pelo espancamento. Ainda hoje, os agentes envolvidos estão em liberdade.

Marielle Franco, mulher negra, lésbica, mãe, cria da favela, vereadora eleita com mais de 46 mil votos na cidade do Rio de Janeiro, foi brutalmente assassinada em uma emboscada, com pelo menos quatro tiros na cabeça em 2018. As investigações ainda não apontaram os mandantes do crime e a pergunta que ecoa é “quem mandou matar Marielle?”.

Dandara, mulher, travesti, negra, periférica, foi assassinada a tiros na madrugada do dia 13 de agosto de 2021, em frente à sede do Grupo Diversidade Niterói, localizado em uma das avenidas mais movimentadas do município. Seu corpo foi encontrado às margens da Baía de Guanabara e sequer existem notícias sobre a autoria do crime.

Fato é, os assassinatos de Luana, Marielle e Dandara retratam a estrutura racista, misógina e lgbtifóbica mantida no país, que faz com que a violência seja a regra contra esses corpos. A não responsabilização dos mandantes do crime contra Marielle, dos agentes que espancaram Luana e do (os) assassino (os) de Dandara, escancaram a necessidade de reformulação deste sistema de justiça que se utiliza de ferramentas institucionais e legais para continuar o processo de retificação destes corpos. 

Os dados trazidos pelo Anuário de Segurança Pública de 2023 ratificam a alarmante situação: a intolerância e a violência contra essas mulheres crescem absurdamente. O número de feminicídios subiu 6.6%, totalizando 1.400 assassinatos apenas no ano de 2022. O registro de estupro bateu recorde histórico, 205 ocorrências por dia. Ainda assim, apesar de assustadores, é preciso lembrar que os números são subnotificados, graças a falta de confiança no próprio sistema de justiça, que faz com que menos de 10% destas vítimas procure as autoridades para denunciar os abusos.

Assim, o que as mulheres negras em marcha no Julho das Pretas fazem é um serviço para a sociedade como um todo. O Brasil não pode mais tolerar que raça e gênero sejam fatores para existência e manutenção de violência. É preciso que o estado, a sociedade civil, as organizações, se posicionem e se unam a esta luta por direitos que é histórica. Um estado democrático de direito precisa ser capaz de garantir a vida de sua população.

Por Tereza. Por Luana. Por Marielle. Por Dandara. Por todas nós.

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