Será o fim dos Precatórios? AGU contrata o “cérebro” do ChatGPT para economizar bilhões. Veja os impactos para Advogados e Mundo Jurídico

Introdução

Com o objetivo de conter os gastos bilionários com precatórios, o governo tomou uma medida ousada ao contratar os serviços da Microsoft e da OpenAI, empresa responsável pelo ChatGPT. A meta é utilizar a inteligência artificial (IA) para acelerar a análise de milhões de ações judiciais na Advocacia-Geral da União (AGU), focando nos temas de maior impacto fiscal.

Essa iniciativa inovadora visa controlar a crescente conta de precatórios, que tem consumido uma parcela significativa do orçamento público. De acordo com as projeções do Ministério do Planejamento, o governo deverá gastar R$ 70,7 bilhões em 2025 apenas com decisões judiciais desfavoráveis em última instância, sem incluir as requisições de pequeno valor (RPVs), que historicamente somam cerca de R$ 30 bilhões.

Para viabilizar esse projeto, o Ministério do Planejamento liberou R$ 25 milhões em créditos suplementares para a AGU, destinados a este e outros projetos estratégicos. A expectativa é que a adoção da inteligência artificial traga eficiência e precisão ao processo de análise e defesa nos tribunais, resultando em uma economia significativa para os cofres públicos.

Um spoiler para você: a implementação adequada da inteligência artificial (IA) promete reduzir significativamente a quantidade de precatórios e aprimorar a qualidade das teses de defesa e acusação da Advocacia-Geral da União (AGU). Atualmente, os advogados da AGU enfrentam o desafio de gerir cerca de 20 milhões de processos judiciais​, em uma média de 10 mil citações por dia​, além de 80 mil intimações diárias, o que demanda um esforço monumental. Com a IA, esses profissionais poderão ser mais assertivos e otimizar seu tempo ao minimizar tarefas repetitivas e burocráticas.

Se você possui alguma ação com a AGU ou está envolvido em projetos relacionados a precatórios, prepare-se para sentir os efeitos dessa transformação. 

Mesmo que não tenha envolvimento direto, é crucial compreender este avanço, pois outras instituições que adotarem a IA Generativa seguirão um caminho similar. Vale destacar que o Poder Judiciário já utiliza IA e anunciou recentemente grandes projetos com IA Generativa, sublinhando a importância de entender e começar a aplicar essa tecnologia. 

Você certamente já ouviu a expressão: “Você não será substituído pela IA, mas por alguém que saiba utilizá-la”. Nesse contexto, podemos afirmar que a instituição que adotar a IA de forma intensiva (como potencialmente o caso da AGU) poderá impactar significativamente a todos os envolvidos em seus processos.

O que são precatórios e por que são um problema para o governo?

Os precatórios são dívidas judiciais que o governo é obrigado a pagar após perder ações na Justiça em última instância. Essas dívidas podem ser de natureza diversa, desde indenizações por danos causados pelo Estado até o pagamento de benefícios atrasados a servidores públicos.

O problema é que o valor total dos precatórios tem crescido exponencialmente nos últimos anos, saltando de R$ 37,3 bilhões em 2015 para uma projeção de mais de R$ 100 bilhões em 2025, considerando os precatórios e as RPVs (requisições de pequeno valor). Esse montante representa cerca de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e supera em 15% o valor que o governo projeta pagar em seguro-desemprego e abono salarial no próximo ano.

Diante desse cenário desafiador, o governo decidiu adotar uma abordagem inovadora, recorrendo à inteligência artificial para tentar reduzir esses custos astronômicos.

A contratação da Microsoft e da OpenAI

Para implementar essa solução de ponta, o governo federal contratou os serviços da Microsoft e da OpenAI, a empresa responsável pela criação do ChatGPT, uma Inteligência Artificial Generativa que tem impressionado o mundo com sua capacidade de gerar textos coerentes e contextualmente relevantes além de executar com qualidade, várias tarefas, inclusive no mundo jurídico. 

A Microsoft fornecerá a ferramenta de inteligência artificial por meio de sua plataforma de computação em nuvem Azure, que disponibiliza o serviço da OpenAI. Essa parceria estratégica permitirá que a AGU tenha acesso a tecnologias de ponta no campo da IA, com o objetivo de otimizar suas operações e reduzir os custos associados aos precatórios.

Como a inteligência artificial será utilizada pela AGU

A adoção da inteligência artificial pela AGU abrangerá várias frentes, desde a triagem inicial de processos até a produção de textos jurídicos e análise de dados. Vamos explorar cada uma dessas áreas em detalhes.

Triagem de processos

Um dos principais desafios enfrentados pela AGU é lidar com o volume massivo de processos judiciais. Com a ajuda da IA, a triagem desses processos será aprimorada, permitindo que as características de cada ação sejam identificadas com maior rapidez e precisão. Utilizando algoritmos de aprendizado de máquina, a AGU poderá classificar e priorizar os casos de acordo com critérios pré-estabelecidos, como o valor da causa, a complexidade do tema e a probabilidade de sucesso.

Essa triagem inteligente permitirá que os advogados públicos se concentrem nos casos mais relevantes e com maior potencial de impacto nas contas públicas. A ferramenta fornecerá sugestões de modelos e teses que poderão ser utilizados pelos advogados do governo nos tribunais, com base na análise automatizada dos documentos e na vasta base de conhecimento da AGU. Além disso, a IA poderá identificar processos similares e sugerir estratégias de defesa padronizadas, aumentando a eficiência e a consistência da atuação da AGU.

Mapeamento de tendências e estratégias de defesa

Além da triagem inicial, a inteligência artificial será empregada para mapear tendências e possíveis frentes de atuação para a AGU. Essa análise preditiva permitirá que o órgão antecipe cenários e desenvolva estratégias de defesa mais eficazes, especialmente nos temas que geram maior impacto fiscal. Ao analisar grandes volumes de dados, incluindo decisões judiciais, jurisprudência e doutrina, a IA poderá identificar padrões e correlações que auxiliem na elaboração de teses jurídicas mais robustas.

Por exemplo, a IA poderá detectar padrões em decisões judiciais anteriores e sugerir linhas de argumentação que tenham sido bem-sucedidas em casos semelhantes, além de identificar argumentos que têm sido mais aceitos pelos tribunais em determinados tipos de casos. Essa abordagem proativa pode ajudar a evitar ou mitigar os custos associados a decisões desfavoráveis ao governo. Adicionalmente, a tecnologia poderá monitorar mudanças legislativas e regulatórias, alertando os advogados públicos sobre potenciais impactos nos processos em andamento, permitindo que a AGU adapte sua estratégia de defesa de forma mais eficaz.

Produção de textos jurídicos

A inteligência artificial promete revolucionar a produção de textos jurídicos, como resumos de documentos, manifestações a serem apresentadas nos tribunais, petições, recursos e pareceres. Utilizando modelos de linguagem natural, como o GPT-3, e a vasta base de conhecimento da AGU como contexto, a IA poderá gerar documentos de forma automatizada, alinhados com as teses e posicionamentos da instituição.

Essa capacidade de produção textual automatizada não apenas economizará tempo valioso dos advogados e servidores, mas também garantirá uma maior consistência, padronização e qualidade nas peças jurídicas apresentadas pelo governo. Os advogados públicos poderão revisar e aprimorar os documentos gerados pela IA, em vez de ter que escrevê-los do zero, otimizando ainda mais o uso dos recursos e assegurando a excelência dos textos produzidos.

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Análise de dados e jurimetria

Por fim, a ferramenta de inteligência artificial será utilizada para realizar levantamentos estatísticos e análises de dados sobre o acervo de processos da AGU. Essa jurimetria permitirá uma gestão mais eficiente das informações, auxiliando na identificação de padrões, tendências e oportunidades de melhoria.

Com base nessas análises, a AGU poderá tomar decisões mais embasadas e desenvolver estratégias mais assertivas, visando reduzir os custos associados aos precatórios e otimizar a alocação de recursos.

Benefícios esperados da adoção da IA

A adoção da inteligência artificial pela AGU traz uma série de benefícios potenciais, tanto em termos de eficiência operacional quanto de economia financeira. Alguns dos principais benefícios esperados incluem:

  1. Redução dos custos com precatórios: Ao aprimorar a triagem de processos, mapear tendências e desenvolver estratégias de defesa mais eficazes, a AGU espera reduzir significativamente os gastos com precatórios, que têm consumido bilhões dos cofres públicos anualmente.
  2. Aumento da produtividade: Com a automação de tarefas como a produção de textos jurídicos e a análise de dados, os advogados e servidores da AGU poderão focar seus esforços em atividades de maior valor agregado, maximizando sua produtividade.
  3. Consistência e qualidade: A utilização da base de conhecimento da AGU como contexto para a produção de textos pela IA garantirá uma maior consistência e alinhamento com as teses e posicionamentos da instituição, elevando a qualidade das peças jurídicas apresentadas.
  4. Tomada de decisão mais embasada: As análises preditivas e a jurimetria fornecidas pela IA permitirão que a AGU tome decisões mais embasadas e estratégicas, antecipando tendências e identificando oportunidades de melhoria.
  5. Economia de tempo: Ao automatizar tarefas repetitivas e demoradas, como a análise de grandes volumes de documentos, a inteligência artificial permitirá que os advogados e servidores economizem tempo valioso, que poderá ser redirecionado para atividades mais complexas e estratégicas.

Preocupações e críticas ao uso da IA no setor jurídico

Apesar dos benefícios potenciais, a adoção da inteligência artificial no setor jurídico também suscita uma série de preocupações e críticas que precisam ser cuidadosamente consideradas. Algumas das principais questões levantadas incluem:

<h3>Viés algorítmico e discriminação</h3>

Uma das principais preocupações em relação ao uso da IA no Direito é o risco de viés algorítmico e discriminação. Os algoritmos de aprendizado de máquina são treinados com base em dados históricos, que podem refletir preconceitos e desigualdades presentes na sociedade.

Se esses vieses não forem identificados e corrigidos, a IA poderá perpetuar e até mesmo amplificar a discriminação, tomando decisões enviesadas com base em características como raça, gênero, classe social ou orientação sexual.

Para mitigar esse risco, é fundamental que a AGU estabeleça mecanismos de auditoria e monitoramento dos algoritmos utilizados, garantindo que eles sejam transparentes, explicáveis e livres de vieses indesejados.

<h3>Transparência e explicabilidade dos algoritmos</h3>

Outra preocupação relevante é a falta de transparência e explicabilidade dos algoritmos de IA. Muitas vezes, esses algoritmos são considerados “caixas pretas”, ou seja, seu funcionamento interno é desconhecido ou de difícil compreensão para os usuários finais.

Essa falta de transparência pode gerar desconfiança e dificultar a responsabilização em casos de erros ou decisões questionáveis tomadas pela IA. Além disso, a explicabilidade dos algoritmos é essencial para que os advogados possam entender e contestar as recomendações fornecidas pela IA, garantindo que elas estejam alinhadas com os princípios do Direito e da justiça.

Para enfrentar essa questão, a AGU deve investir em mecanismos de explicabilidade, como a utilização de técnicas de aprendizado de máquina interpretável e a documentação clara dos critérios e parâmetros utilizados pelos algoritmos.

<h3>Privacidade e segurança dos dados</h3>

A utilização da IA no setor jurídico também levanta preocupações relacionadas à privacidade e à segurança dos dados. Os algoritmos de aprendizado de máquina requerem grandes volumes de dados para seu treinamento e operação, incluindo informações sensíveis sobre processos judiciais e partes envolvidas.

É essencial que a AGU adote medidas robustas de proteção de dados, em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e outras regulamentações aplicáveis. Isso inclui a implementação de controles de acesso, criptografia, anonimização e políticas de retenção e descarte de dados.

Além disso, a AGU deve estabelecer protocolos de segurança cibernética para prevenir vazamentos, acessos não autorizados e ataques maliciosos que possam comprometer a integridade e a confidencialidade dos dados utilizados pela IA.

É importante mencionar que, em sua configuração padrão, o ChatGPT coleta todos os dados inseridos. No entanto, há uma maneira fácil de configurá-lo para que não utilize seus dados. Para saber como, clique aqui.

<h3>Impacto no mercado de trabalho e na formação jurídica</h3>

A adoção da IA no setor jurídico também suscita preocupações em relação ao impacto no mercado de trabalho e na formação dos profissionais do Direito. Alguns temem que a automação de tarefas possa levar à redução de postos de trabalho e à desvalorização de certas habilidades jurídicas tradicionais.

No entanto, é importante ressaltar que a IA não substituirá completamente os advogados, mas sim atuará como uma ferramenta de apoio, liberando-os para se concentrarem em atividades mais estratégicas e criativas. Ainda assim, será necessário repensar a formação jurídica, incorporando conhecimentos de tecnologia, ciência de dados e ética da IA nos currículos das faculdades de Direito.

Além disso, a AGU deve investir na capacitação contínua de seus advogados, para que eles possam utilizar a IA de forma eficaz e responsável, compreendendo seus limites e potencialidades.

Não adianta ter a ferramenta e não saber utilizar, neste sentido os advogados irão precisar investir tempo em entender como “conversar” com a Inteligência Artificial, pois sim, existem melhores práticas para se extrair os melhores resultados. 

O futuro da inteligência artificial na advocacia 

A adoção da inteligência artificial pela AGU representa apenas o início de uma transformação mais ampla no setor jurídico, impulsionada pelos avanços tecnológicos. À medida que a IA se torna mais sofisticada e confiável, é provável que seu papel na advocacia pública se expanda ainda mais.

Podemos imaginar cenários futuros em que a IA não apenas auxilia na análise de processos e produção de textos, mas também fornece recomendações estratégicas e até mesmo participa de audiências e julgamentos, apresentando argumentos e contra-argumentos de forma autônoma.

No entanto, é importante ressaltar que a inteligência artificial não substituirá completamente os advogados e servidores humanos, mas sim atuará como uma ferramenta poderosa para aumentar sua eficiência e capacidade de tomada de decisão.

À medida que a IA se torna mais integrada ao sistema jurídico, surgirão novos desafios éticos, legais e regulatórios que deverão ser enfrentados. Questões como a responsabilidade legal por decisões tomadas por sistemas de IA, a privacidade e a segurança dos dados, e a necessidade de transparência e explicabilidade dos algoritmos deverão ser cuidadosamente abordadas.

Além disso, será fundamental investir na capacitação e treinamento dos profissionais do Direito para que possam trabalhar de forma eficaz com essas novas tecnologias, compreendendo suas capacidades, limitações e implicações éticas.

Conclusão

A contratação dos serviços da Microsoft e da OpenAI pelo governo representa um passo ousado e inovador na busca por soluções para o desafio dos precatórios. Ao adotar a inteligência artificial na Advocacia-Geral da União, o governo espera economizar bilhões de reais e aumentar a eficiência e assertividade na análise e defesa de processos judiciais.

No entanto, é crucial que essa iniciativa seja implementada com cautela e responsabilidade, abordando preocupações legítimas sobre viés algorítmico, transparência, privacidade e segurança de dados. O governo e a AGU devem trabalhar em estreita colaboração com especialistas em ética de IA, juristas e a sociedade civil para garantir que essa tecnologia seja utilizada de forma justa, ética e alinhada com os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.

Ao mesmo tempo, é essencial investir na capacitação dos profissionais do Direito para que possam aproveitar ao máximo os benefícios da inteligência artificial, sem perder de vista o papel fundamental dos seres humanos na tomada de decisões críticas e na preservação dos valores e princípios que norteiam o sistema jurídico.

Com uma abordagem equilibrada e responsável, a adoção da inteligência artificial pela AGU pode representar um marco na modernização e eficiência da advocacia pública brasileira, contribuindo para a redução dos gastos com precatórios e a otimização dos recursos públicos.

Eu sou o Leo Toco, novo colunista da Fenalaw e especialista em Inteligência Artificial e Gestão Ágil para escritórios, departamentos jurídicos e outras áreas do Direito. Você pode me contactar e encontrar Podcasts, Newsletters, entre outros recursos aqui: https://linktr.ee/leotoco

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