O que é justiça? Poderíamos passar anos discutindo e refletindo sobre o que é justiça. Grandes filósofos já se debruçaram sobre esse tema e nenhum deles conseguiu esgotar a simples pergunta: o que é justiça?
O conceito de justiça é bastante recorrente no mundo jurídico, religioso e filosófico. O tema costuma ser tão amplamente difundido que nosso subconsciente o aplica o tempo todo sem que percebamos. O senso de justiça está nas tomadas de todas as decisões, das mais banais às mais complexas. Quando alimentamos os nossos animais de estimação, na quantidade adequada de ração ou se devem comer ou não, a decisão de tomar banho uma ou duas vezes por dia também é uma questão de justiça. Com isso é fácil constatar que estamos a todo momento medindo com a régua da justiça, do justo e do injusto.
Mas o que é justiça? Segundo Platão justiça é algo absoluto e bom, a justiça é sábia, harmônica e feliz, na medida em que a negação da mesma é a injustiça, inculta, desarmônica e infeliz, (livro: A República- Platão), caminhando mais alguns séculos temos o presidente do STF, Luiz Fux, defendendo que “a justiça é a asseguração dos Direitos Fundamentais da pessoa humana. “No meu modo de ver, a Justiça na democracia é o homem ser tido como centro de gravidade do ordenamento jurídico, e respeitar as cláusulas pétreas que estão estabelecidas na Constituição. A Justiça é ponte por onde passam todas as misérias e aberrações. O juiz há de ter a sensibilidade para fazer uma justiça caridosa e uma caridade justa”. (O que é Justiça para você?)
Percebe-se que quando falamos em justiça quer seja em Platão há séculos atrás ou na exposição do atual ministro e até no julgamento popular estamos falando em “dar a cada um o que lhe é devido”. Na teoria funciona bem, mas na prática iremos encontrar algumas contradições, de toda sorte! É assim que o inconsciente coletivo funciona. É assim que o nosso inconsciente opera o tempo todo. Acreditamos que estamos a todo momento fazendo justiça e, por isso, vivemos em um mundo até certo ponto justo.
O mundo justo, meritocrático em que, incontestavelmente, acreditamos viver, precisa ser colocado a prova, como uma mera hipótese. Hipótese que já foi superada no livro “A tirania do Mérito” de Michael Sandel. No entanto, o mito do mundo justo está tão fortemente arraigado em nossa sociedade que, questionar a justiça passa a ser uma heresia, sujeita a morte virtual e, em alguns casos física, como aconteceu na data de ontem, 10/07, com o guarda municipal Marcelo Arruda, assassinado na cidade de Foz do Iguaçu PR. (Correio brasiliense 2022)
Contestar a justiça é uma tarefa árdua e salutar que deve ser iniciada em nós mesmos até que consigamos atingir a maturidade de compartilhar com os outros. A Justiça é o objeto principal de todas as instituições da sociedade, mas precisamos aceitar que vivemos em um mundo injusto e que, temos apenas uma pequena hipótese do mundo justo.
Compreender que o mundo é injusto é uma tese simples que muda toda a forma como agimos e interagimos com o mundo.
“Quase todo mundo tem a necessidade de acreditar que o mundo é justo; é a chamada “hipótese do mundo justo”. Essa necessidade é tão forte que as pessoas são mais inclinadas a culpar a vítima por seu destino do que aceitar que coisas ruins podem acontecer com gente boa.” (Johnson, Stefanie K. p. 53)
Ao perceber o mundo injusto com às mulheres, devemos, de alguma forma recompensá-las pelas injustiças que sofrem diariamente. Se somos esposo(a) ou filho(a) começamos a lavar a louça e limpar a casa; entretanto, perceberemos que isso não é o suficiente por que foram anos de injustiça. Constatamos que teremos de dar um passo maior: precisaremos dar condições para que elas, se possível, recuperem o tempo perdido por conta das injustiças sofridas. Pagaremos, então, um curso de idioma estrangeiro, ou poderíamos fazer qualquer outra coisa que lhe poupe um pouco de tempo e energia.
Quando vejo que o mundo é injusto com os homossexuais, começo a defende-los(as) de falas injustas ou homofóbicas, mas logo veremos que isso é insuficiente. Devemos passar a contratar pessoas LGBTQIA+ em nossas empresas, escolas, instituições; começamos indicar e auxiliar nas contratações. Incluímos estas pessoas no nosso círculo de bons relacionamentos.
Da mesma forma deve ser o tratamento com as pessoas negras. Suspeitando que o mundo é injusto, que o racismo acentua ainda mais estas injustiças, é preciso que façamos muito mais. Parafraseando a feliz fala de Ângela Davis, “apenas não ser racista não é suficiente, é preciso ser antirracista”. Ser antirracista é dar um passo a frente quando a polícia chega, é preciso que cada um de nós façamos ações afirmativas. A neutralidade, neste caso é prejudicial, discriminatória.
O que estou tentando dizer é que a diversidade passa pela compreensão de que não vivemos em um mundo justo! Para que todos(as) entendam os motivos, o porquê de ser necessária a implementação da política de inclusão – quer seja por cotas ou por qualquer outro meio. É preciso que todos(as) internalizem o quanto o mundo é injusto com as mulheres, mulheres negras, homens negros, pessoas com deficiência, pessoas LGBTQIA+, pessoas que estão fora do padrão estético e outros grupos que são gravemente discriminados.
Neste contexto, nosso objetivo é conscientizar as pessoas de que o mundo é injusto e que é possível reduzir as injustiças. Pensar qualquer coisa fora disso é cometer injustiça (pode ser consciente ou inconsciente), é certo que aqueles que lerem este texto e ainda assim decidirem continuar se portando como se o mundo fosse justo, não poderão se justificar pela ignorância.
Por fim, é preciso frisar que a discriminação é uma forma muito perversa de agravar a injustiça. Discriminar por qualquer que seja o motivo demonstra o quanto o ser humano pode ser diabólico. Por outro lado, o ato de incluir, diversificar demostra o quanto o ser humano pode ser bom!
“Os que acham que a MORTE é o maior de todos os males é porque não refletiram sobre os males que a INJUSTIÇA pode causar.” (Sócrates)
Referenciais teóricos
Correio Brasiliense Disponível em https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/07/5021309-video-mostra-momento-em-que-dirigente-do-pt-e-assassinado-por-bolsonarista.html 11 de julho de 2022 às 12h.
Johnson, Stefanie K. Inclusifique: como a inclusão e a diversidade podem trazer mais inovação à sua empresa; traduação de Ada Felix. – São Paulo: benvirá, 2020.
O que é Justiça para você? Disponível em https://www.amb.com.br/o-que-e-justica-para-voce/ Acesso em: 11 de julho de 2022 às 11h25.
Platão, A República. Bauru: EDIPRO, 1994.
Roudinesco, Elisabeth. A parte Obscura de nós mesmos: uma história dos perversos; tradução André Telles, revisão técnica Marco Antônio Coutinho Jorge. – 1ª ed. – Rio de Janeiro: Zahar, 2008.