Atuação humana nas organizações (inclusive na área jurídica)

A própria evolução da humanidade se encarregou de criar, de motivar e de aplaudir a geração de ferramentas, depois de máquinas, modelos de gestão e de produção, na sequência “softwares”, e assim por diante – que talvez consigamos agrupar e generalizar (para simplificar) como uma busca pela automação.

De forma geral, há muito tempo se festeja a automação de tarefas antes realizadas totalmente pelas pessoas (de início, inclusive, de forma manual), como forma de reduzir o esforço (e o desgaste) dos trabalhadores, de aumentar a velocidade da produção (e de algumas ações e atividades), de reduzir custos etc.; e de fato há muito a reconhecer e a celebrar.

E não apenas nas atividades mais diretamente reconhecidas como profissionais, pois essa “modernização” chegou a praticamente tudo o que fazemos e vivemos, em casa, e na vida em geral.

O “mundo” (e todos nós) deve muito à evolução da tecnologia, da ciência e mais modernamente da automação, mas seria muito simplista avaliarmos “apenas um lado” da questão, sem uma visão um pouco mais crítica.

Nas últimas décadas diversas atividades foram passando rapidamente das mãos das pessoas para as máquinas, inclusive com o incremento da própria automação, e dos chamados “robôs”.

Essa “evolução” foi transformando a nossa vida, o nosso trabalho, e as profissões, uma vez que ao longo do tempo diversas atividades e profissões foram sendo substituídas por outras.

Pessoas mais “maduras/jovens há mais tempo” ainda se lembrarão de ascensoristas, datilógrafos, operadores de rádio, de telex e de fax, contínuos, telefonista, lanterninha, fotografo 3×4 e revelador, leiteiro, e tantas outras profissões. E há, ainda, algumas que já são raras como porteiro, secretária e sapateiro, dentre muitas mais.

Nossa vida “melhorou” em muitas frentes e aspectos, mas acreditamos que seja necessário e salutar pensarmos, ainda que periodicamente, de forma mais ampla e profunda sobre o que tende a ser o mercado de trabalho e a atuação das pessoas nas organizações nos próximos anos.

E não pensamos apenas em substituição de profissões (uma vez que algumas se vão para outras chegarem), mas na própria atividade humana nas organizações, uma vez que em principio não parece haver limite ou barreira para a dominação pela chamada tecnologia e pela automação.

A chamada Inteligência Artificial chegou ao mercado na mesma linha, uma vez que se propõe, dentre outros aspectos, a ser mais rápida, mais barata, e (“talvez”) melhor do que os humanos – de início em algumas atividades.

Pouca gente parece se dar conta de que esse “caminho” tende a mudar radicalmente a própria atuação humana nas organizações, uma vez que muitas (e quem sabe todas) as atividades podem vir a ser “delegadas” à tecnologia.

À medida em que os sistemas e a IA avancem e melhorem, muita gente pode vir a acreditar que não precisa mais de humanos na sua área, na sua equipe, ou até na sua empresa – inclusive para atividades ligadas justamente a tecnologia e sistemas (que podem vir a se “criar e evoluir” sozinhos).

Por enquanto, o que mais se vê é a tendência (em alguns aspectos preocupante) de se alocar à tecnologia diversas das funções mais simples e repetitivas nas organizações, inclusive na área jurídica.

Nesse sistema, as tarefas e atuações humanas ficam mais restritas aos profissionais mais experientes e seniores, que tem passado a atuar quase que como “corretores, fiscais e revisores” do que os sistemas fazem e produzem.

Sem entrarmos no mérito do acerto (ou não) da tendência, até mesmo pelo simples fato de que o próprio futuro se encarregará de mostrar o que funcionou e os problemas que foram gerados pelo movimento, preocupa-nos o que farão os profissionais que estão se preparando neste momento para “futuras posições” mais seniores, ou mesmo que pretendem ingressar no mercado nos próximos anos.

Muitos fatores indicam que se as organizações deixarem de contratar e de treinar as pessoas mais jovens (como já vem ocorrendo em muitas áreas – inclusive no Direito), de um lado elas terão que procurar outras atividades e até profissões (e em certa medida podem até vir a ser mais felizes e produtivas dedicando-se a áreas mais modernas, interessantes e agradáveis às “novas gerações”), e de outro lado as próprias organizações provavelmente experimentarão um “apagão” de profissionais seniores e experientes em alguns anos (pois se não chegarem mais juniores ao mercado, quem serão os seniores do futuro, e que os orientará e treinará?).

Convidamos o mercado, e o setor jurídico como um todo (inclusive empresas, escritórios de advocacia, faculdades de direito etc.), a refletir sobre o tema, e seus possíveis efeitos.

Logicamente o convite não é para cairmos cair na armadilha de sermos meramente favoráveis ou contrários à tecnologia e à automação (até por já ser uma realidade, e cada vez mais natural), e nem para tentarmos adivinhar detalhes de como será a chamada advocacia do futuro, mas para tentarmos avaliar de maneira mais profunda as tendências, e seus possíveis e prováveis efeitos (consequências práticas) – para nos prepararmos para o futuro, e para tentarmos influenciá-lo.

Se as empresas deixarem de contratar, de treinar e de estimular os mais jovens a ingressar no mercado, proporcionando-lhes boas e interessantes oportunidades, que os motivem a seguir estudando e preparando-se para o mercado e para suas carreiras, e ao mesmo tempo encontrar maneiras de estimular os mais experientes e seniores a seguirem percebendo valor e até motivo de terem colegas a serem treinados – ao invés de simplesmente adotarem a tecnologia, corremos o risco de não termos profissionais seniores e experientes em algum tempo.

E, caso esse cenário de fato se avizinhe, quais serão as atividades empresariais alocadas aos humanos – do direito e nas organizações de forma geral?

À medida em que a tecnologia melhore e evolua, erre menos, e seja mais eficiente, e se seguir como opção mais rápida e barata, ela passará a também tomar decisões, correr riscos, e, no limite, a “integrar” os mais altos escalões nas organizações – substituindo as pessoas. E qual será o limite?

O mesmo pode vir a ocorrer nos escritórios de advocacia, pois se os mais seniores não continuarem a ser substituídos, com o tempo, pelos mais jovens, que deixarão de ser treinados e valorizados, e se as faculdades de direito deixarem de formar bacharéis (que no limite não poderão fazer estágios e terão ainda mais dificuldade para conseguirem emprego), muita coisa “mudará” no mercado.
E, se nas empresas a alta gestão, e talvez até mesmo grande parte (ou a totalidade) da área jurídica for alocada à tecnologia, o que será alocado aos escritórios de advocacia – e por quem? Quem tomará a decisão, e quem fará a gestão do risco?

O mesmo ocorrerá nas demais áreas, nas quais ainda não sabemos serão as atividades alocadas aos humanos, se as “máquinas” forem cada vez mais “inteligentes”?

Temas e áreas como financeiro, operação, marketing, vendas, suprimentos e tantas outras, poderão ser totalmente automatizadas? Qual será o limite?

As estratégias corporativas poderão vir a ser elaboradas e definidas por inteligência artificial?

Logicamente, não temos respostas a todas essas questões, e talvez nossa possível interferência nesses processos seja bem reduzida, mas entendemos que já é tempo de todos pensarmos em como as organizações poderão se organizar, e preparar para esse “novo cenário”, quase que totalmente digital, tecnológico, automatizado e “moderno”.

Esperamos que os líderes, os investidores e os executivos nas mais altas posições nas organizações estejam percebendo essa “revolução” e seus possíveis efeitos (já a curto e a médio prazos), para que as organizações de fato se programem.
E que toda a área jurídica também se prepare e organize para as demandas, as atuações, os assuntos, a forma de trabalhar, a maneira de formar profissionais etc, para que humanos não deixem de participar da realidade corporativa.

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