Entrevistamos Paulo Souza, sócio de Cálculos Judiciais na Bernhoeft, sobre o uso de tecnologia e inteligência artificial na rotina jurídica. Ao longo da conversa, ele compartilhou exemplos de automações que descomplicam processos, falou sobre os desafios da cultura orientada por dados e refletiu sobre os limites da tecnologia diante da complexidade do Direito.
Paulo defende uma abordagem em que a inovação caminha lado a lado com empatia, escuta ativa e análise contextualizada — elementos que, segundo ele, continuam sendo fundamentais para decisões estratégicas e relações de confiança no meio jurídico.
1. Em tempos de inteligência artificial, como garantir uma abordagem humanizada?
Mesmo com o avanço das tecnologias, acreditamos que decisões estratégicas continuam exigindo escuta ativa, empatia, repertório técnico e muito relacionamento entre as pessoas. A tecnologia pode acelerar processos, aumentar a produtividade, diminuir os erros, mas é a sensibilidade humana que assegura conexões duradouras, trazendo um olhar diferenciado nas análises dos dados e entende o contexto individualizado de cada cliente. Na Bernhoeft, usamos a IA como meio para nos apoiar, mas sem abrir mão do relacionamento próximo e da personalização que o jurídico corporativo exige em todos os âmbitos dessa relação. Inclusive um dos pilares da nossa missão é baseada nesses termos: “Entregar valor de forma descomplicada e humanizada”
2. Poderia nos dar exemplos de tecnologias que descomplicam a rotina da equipe ou dos clientes?
Nós sempre fomos muito curiosos e nunca deixamos de andar juntos com as novidades tecnológicas do mercado, temos um time de tecnologia interno dedicado a trazer e colocar na rotina do dia a dia da nossa operação essas inovações na prática. Hoje contamos com o auxílio da IA e muitas automações para etapas operacionais dos cálculos judiciais, como a análise detalhada dos autos trazendo um resumo completo de todos os pontos principais daquela ação, a quebra de documentos editáveis dos processos, trazendo eficiência, agilidade e qualidade nos dados extraídos para as liquidações dos cálculos, elaboração de inúmeros relatórios que facilitam o acompanhamento estratégico para que o jurídico tenha indicadores precisos para a melhor tomada de decisão e fluxos digitais que integram as informações dos nossos cálculos aos sistemas jurídicos dos clientes, reduzindo o retrabalho, gerando visibilidade em tempo real e liberando o jurídico interno das empresas para focar em análises mais pormenorizadas e estratégicas para as empresas, decisões que muitas vezes necessitam desses indicadores em tempo real.
“Ainda é comum que decisões sejam tomadas com base apenas na percepção individual ou na urgência do dia a dia. Implantar uma cultura orientada por dados requer governança, estruturação das informações jurídicas e, principalmente, o engajamento da liderança.”
3. Qual é o maior desafio ao implementar uma cultura orientada por dados?
No âmbito do Direito, os departamentos jurídicos e escritórios de advocacia, lidam com informações, em sua maioria, confidenciais e sensíveis, o que se faz necessários uma abordagem cuidadosa para que se garanta a privacidade e segurança dos dados, o principal desafio é mudar a cultura de atuação reativa para uma abordagem mais estratégica orientada por dados. Ainda é comum que decisões sejam tomadas com base apenas na percepção individual ou na urgência do dia a dia. Implantar uma cultura orientada por dados requer governança, estruturação das informações jurídicas, como provisões, passivo oculto e indicadores de risco, e, principalmente, o engajamento da liderança para que os dados deixem de ser apenas relatórios descritivos e passem a embasar decisões que protegem e impulsionem o planejamento das empresas, trazendo assim, o real valor da cultura orientada por dados.
4. Existe alguma decisão que a tecnologia ainda não consegue apoiar bem e continua dependendo do olhar humano?
No mundo jurídico, pela complexidade e as muitas variáveis que nossa legislação contém, creio ser muito difícil ser interpretado com o viés específico de cada empresa, pois os algoritmos e modelos de dados, conseguem fazer uma análise fria dos mesmos, o que não será o resultado esperado pelos seus clientes. É fundamental ter contexto nas análises das decisões jurídicas, pois a maioria delas se baseiam na subjetividade, e a tecnologia pode ter dificuldade em suas análises por não ter esse contexto, e ainda não conseguir replicar as experiências e habilidades desempenhadas por profissionais do direito ao longo de suas carreiras. O discernimento jurídico e a experiência ainda são insubstituíveis quando há variáveis interpretativas ou riscos reputacionais envolvidos, creio que a tecnologia pode ser utilizada para auxiliar os atores do direito na melhor tomada de decisão, fornecendo informações relevantes, identificando padrões e tendências, automatizar tarefas rotineiras, melhorar a eficiência dos processos jurídicos e liberar tempo para que os profissionais do direito se concentrem em tarefas mais complexas e criativas.
5. Quais competências humanas você acredita que se tornarão ainda mais valiosas à medida que a tecnologia evolui?
A capacidade analítica, o pensamento crítico, a comunicação estratégica e a habilidade de construir confiança serão cada vez mais valiosas. À medida que a tecnologia assume tarefas operacionais, o diferencial estará em quem consegue traduzir dados em decisões mais assertivas e mais céleres, comunicar cenários com clareza e manter relações sólidas em ambientes complexos e em constante mudança farão toda a diferença no mercado de trabalho e na vida pessoal. Creio que à medida que a tecnologia evolui é fundamental que sejamos criativos, inovadores e muito eficientes nas áreas de atuação.
Paulo Souza é sócio de Cálculos Judiciais na Bernhoeft, é Administrador, Contador, Pós-graduado em Perícia, com formação pela FECAP, Universidade Cidade de São Paulo e Faculdade Drummond.
Atua há 25 anos com o desenvolvimento de trabalhos de Gestão de Contingência Trabalhista, Cálculos Judiciais Trabalhistas e Cíveis para pequenas, médias e grandes empresas de diversos segmentos.