Tecnologia, inovação e o futuro da advocacia

Vivemos uma era em que nos relacionamos, em boa parte do tempo, por meio da tecnologia. Principalmente de dois anos para cá, como consequência da pandemia, todos os setores de negócios tiveram que se familiarizar rapidamente com recursos que possibilitassem a troca de informações de forma não presencial e agilidade na execução de trabalhos que sempre foram feitos manualmente. Desde então, os investimentos em ferramentas que permitem a comunicação em tempo real sem a presença física, assim como os investimentos em processos tornaram-se pontos de alta prioridade. Essa realidade certamente pavimenta o caminho para o futuro dos escritórios de advocacia.

Além do uso da tecnologia para comunicação, alguns trabalhos e processos jurídicos foram rapidamente digitalizados, como, por exemplo, os sistemas de arquivos, protocolos, relatórios diversos de faturamento, cobrança, reembolsos e, mais recentemente, vivenciamos a automação do sistema de trabalho híbrido, com a redução de espaço físico e rotatividade de estações de trabalho para permitir o retorno dos colaboradores aos escritórios. Já é notório que avançamos muitos anos em tecnologia e na metodologia de trabalho em consequência da crise.

Quanto à forma de atuação dos advogados, a evolução de alguns recursos é notória e começa a redesenhar as estruturas de negócios dos escritórios. A partir do uso da inteligência artificial, de dados e softwares, os trabalhos executados por uma única expertise, ou seja, por um único grupo de prática, tendem a ser “commoditizados”. Inevitável e felizmente, boa parte desse trabalho passa a ser realizado por ferramentas tecnológicas e de forma padronizada.

A tendência é que as entregas que cada escritório oferece se diferenciem principalmente em razão de critérios que a tecnologia não substituirá facilmente.

Heidi K. Gardner, professora da Universidade de Harvard, publicou em 2015 uma pesquisa demonstrando que os escritórios de advocacia que agregarão maior valor no futuro aos clientes são aqueles que capacitarem seus advogados em relação às indústrias em que os clientes atuam,  e que incentivem a organização de equipes multidisciplinares, com capacidade de apresentar soluções completas aos clientes. Essas equipes, pelo seu conhecimento da indústria, conseguem, inclusive, antecipar as necessidades dos clientes e organizar novas linhas de serviços. Surge aí uma migração do valor atribuído aos trabalhos que possam ser exercidos por um único advogado ou grupo de prática, àqueles que representem soluções que agreguem diferentes especialidades.

Parece-me clara a necessidade de inovar na forma com que os escritórios são estruturados. As bancas jurídicas tradicionais sempre tiveram os grupos de prática trabalhando como células separadas, inclusive sob o ponto de vista administrativo, o que abrange diretrizes de remuneração e reconhecimento. A estrutura de organização de grupos multidisciplinares em torno de indústrias nas quais os clientes atuam é uma estrutura conhecida como “colaborativa”, em contraposição à estrutura de grupos de prática que atuam individualmente, fazendo o chamado “cross selling” de trabalho de um grupo para o outro.

O perfil do advogado do futuro também deve mudar. O conhecimento em tecnologia já é essencial, especialmente para os que estão iniciando a carreira. O advogado júnior terá a importante tarefa de customizar aos clientes as ferramentas digitais no mundo jurídico. Além de profundo conhecimento em informática, as habilidades interpessoais e de negociação serão ainda mais valorizadas, já que essas habilidades são de difícil substituição pela tecnologia.  Assim, a capacidade de colaborar em equipes diversas, lidar com pessoas e desenvolver o poder de negociação são alguns dos aspectos que devem ser abordados logo no início da formação profissional.

Sabemos que os advogados são conhecidos por serem, em sua maioria, conservadores e aversos a mudanças. A inovação na forma de trabalho dos escritórios de advocacia não é um processo simples, mas parece ser inevitável perante a irreversibilidade do avanço tecnológico. Trata-se de um exercício diário a todos os líderes de grupos de prática, de indústria ou administradores de escritórios.

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