Iniciado no Brasil Imperial, com a Constituição de 1824, passando pela República com a Constituição de 1891, a primeira fase do constitucionalismo se estendeu de 1824 a 1934, período histórico marcado por transformações políticas profundas como a Independência, a Proclamação da República e a Abolição da Escravatura.
De 1934 a 1988, a segunda fase do constitucionalismo foi evidenciada pelas Constituições de 1934, 1937, 1946 e a de 1967, tendo o período da ditadura militar, de 1964 a 1985, como sendo de aprofundamento da crise política.
A promulgação da Constituição Cidadã em 1988, até então vigente e considerada, em termos de previsões de direitos e garantias individuais e coletivas, como uma das mais avançadas do mundo, marca o início da terceira fase do constitucionalismo.
Ao longo das fases, embora muitas foram as mudanças sociais, políticas e econômicas, percebe-se que, atualmente, com a virtualização das relações humanas, as soluções jurídicas oferecidas mostram-se insuficientes, demandando a preocupação de proteção jurídica também no ambiente digital.
Se, por um lado, garantir a efetividade de direitos e garantias fundamentais foi uma grande conquista ao longo do constitucionalismo analógico; por outro, a velocidade de desenvolvimento das ferramentas digitais e sua incorporação ao cotidiano da sociedade adicionou um componente desafiador a mais quanto à proteção oferecida pelo sistema jurídico.
Expressão relativamente recente e ainda em construção, o constitucionalismo digital não versa somente sobre o impacto do uso das tecnologias em sentido estrito, mas se refere ao momento pelo qual as relações humanas se desenvolvem em ambientes virtuais, o que inclui a árdua tarefa de revisar criticamente a estrutura do constitucionalismo em si, que não foi concebido, originariamente, para enfrentar os desafios tecnológicos atuais.
Nessa nova dinâmica social, revela-se a preocupação de como aplicar os princípios e salvaguardar os direitos fundamentais na esfera digital, fragilizados pela potencialização dos riscos nesse ambiente, destacando, por exemplo, os direitos da personalidade, à privacidade e à proteção de dados pessoais, à liberdade de expressão, considerando a internet permitir o intercâmbio de pessoas pelo mundo afora.
Como divisor de águas em termos de proteção dos direitos fundamentais no ambiente digital, por consignar princípios garantidores da privacidade, liberdade de expressão e neutralidade da rede, foi a Lei nº 12.965/2014 – Marco Civil da Internet.
A chamada era digital trouxe consigo o acesso fácil e rápido à informação. Através da internet, é possível acessar uma gravação de informações, notícias e conhecimentos, o que contribui para a formação de uma sociedade mais atuante e crítica.
Do outro lado da moeda, afigura-se a liberdade de expressão, também direito fundamental e merecedor de proteção, inclusive nos meios digitais.
Esse direito tornou-se ainda mais importante, já que a internet é um meio de comunicação massivo e democrático. As redes sociais, a título de exemplo, permitem que qualquer pessoa possa se expressar livremente, o que, inegavelmente, representa importante conquista para a democracia.
Mas se a censura na internet se revela como ameaça à liberdade de expressão, da mesma forma, essa mesma liberdade de expressão não pode ser tida como absoluta e ilimitada, não lhe sendo permitido utilizar-se dessa roupagem para ferir outros princípios constitucionais.
Nesse sentido, é importante a neutralidade da rede para garantir o acesso igualitário a todos os conteúdos nela disponíveis.
Com a era digital, novos desafios são vivenciados também em relação à proteção de dados pessoais. A Constituição Federal de 1988 garante o direito à privacidade; no entanto, a internet pode ser utilizada como veículo para expor esses dados de maneira indiscriminada.
A Lei nº 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção de Dados foi concebida com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e privacidade das pessoas, estabelecendo diretrizes para a coleta, armazenamento, uso e compartilhamento de dados pessoais por empresas e organizações, inclusive regulamentando o uso de dados pessoais na internet, protegendo a privacidade e a segurança das usuárias e usuários.
Digitalmente, novas formas de cometimento de crimes foram viabilizadas, como os chamados crimes cibernéticos, de forma que mudanças se fazem imprescindíveis, inclusive com a previsão de penas mais severas para crimes como fraude, roubo, extorsão, pedofilia, racismo, bullying, cometidos pelo ambiente da internet.
Assim, se o constitucionalismo brasileiro vem continuamente passando por transformações – e não poderia ser de outra forma – dada a mutabilidade das relações interpessoais e pela necessidade de refleti-las, inclusive pelas oportunidades e riscos trazidos pela tecnologia.
Pelo fato de a expressão constitucionalismo digital ser relativamente nova, é importante que o Brasil continue discutindo esses temas, como resposta aos novos desafios computacionais que se apresentam em velocidade expressiva, no intuito de garantir que a Constituição Cidadã de 1988 continue a ocupar a posição de merecido destaque como uma das mais avançadas do mundo em termos de direitos e garantias individuais e coletivas e assegurando que sejam protegidos e efetivados.


