No sistema jurídico brasileiro, caracterizado por uma litigiosidade estruturada e de grande escala, a gestão eficiente dos riscos não pode mais se basear exclusivamente na experiência individual, na memória institucional ou em percepções fragmentadas da jurisprudência. É nesse cenário que a jurimetria se destaca como um avanço epistemológico relevante: impulsionada pela digitalização dos processos e pela maior transparência dos dados judiciais, ela promove o deslocamento do enfoque tradicional, centrado exclusivamente na norma, para uma análise fundamentada em dados concretos e observações empíricas do comportamento jurisdicional.
A jurimetria qualifica essa leitura ao coletar, organizar e analisar dados derivados das decisões judiciais, permitindo identificar padrões consistentes, estimar probabilidades de sucesso, prever prazos processuais e transformar incertezas em parâmetros quantificáveis de risco e estratégia. Isso desloca a atuação jurídica para além do puro embasamento normativo, integrando análises descritivas e preditivas fundamentadas em evidências reais.
Essa racionalidade empírica redefine o papel dos departamentos jurídicos nas organizações. Em vez de atuarem apenas reativamente ou como instâncias de validação, eles se transformam em unidades estratégicas, participando da formulação antecipada de cenários, da definição de políticas de negociação, da alocação eficiente de recursos litigiosos e da construção de indicadores que dialogam diretamente com áreas como controladoria, auditoria, finanças e alta administração. Para tanto, o jurídico não precisa só de conhecimento técnico-jurídico, mas de competências analíticas e visão institucional apurada.
Apesar disso, é possível perceber que a incorporação da jurimetria ao ambiente jurídico não se dá sem obstáculos. Além dos limites técnicos, como a qualidade e padronização dos dados disponíveis, frequentemente marcados por ausência de metadados estruturados e ambiguidade interpretativa, os desafios são também metodológicos e culturais. A análise estatística exige formações específicas que ainda estão ausentes no ensino jurídico tradicional. Institucionalmente, muitas organizações mantêm modelos de gestão jurídica reativos, onde a inovação é vista como um acessório e não como um vetor de reposicionamento funcional.
Superar esses limites não significa substituir a análise dogmática pela estatística, mas sim articular essas duas racionalidades. O valor da jurimetria reside em tensionar, por meio dos dados, práticas jurídicas consolidadas, protagonizar escolhas estratégicas mais qualificadas e fundamentar decisões com base em evidências objetivas, abandonando a simples autoridade formal.
A jurimetria, assim, não é um objetivo final, mas sim uma linguagem, um método e uma prática que aproximam o jurídico da racionalidade institucional contemporânea. Um jurídico que conhece seus dados, como por exemplo, quanto custa manter uma tese reiteradamente rejeitada em segunda instância, qual o tempo médio de execução fiscal em determinada comarca, ou o padrão decisório de uma vara cível diante de cláusulas limitativas de responsabilidade, é um jurídico que atua com previsibilidade, que se comunica efetivamente com o negócio e participa das decisões que ultrapassam o campo do contencioso.
Não por acaso, nos principais fóruns sobre modernização da prática jurídica, como o Projuris Summit, o uso estruturado de dados é recorrente, não mais como promessa, mas como componente prático da gestão jurídica atual.
A força da jurimetria está em esclarecer o jurídico, não meramente em automatizá-lo. Está em ancorar o julgamento na evidência e em exigir que a interpretação dialoga com o que efetivamente se passa nos processos judiciais. Inovar em 2025 no Direito é, sobretudo, inovar no método. E a jurimetria é parte fundamental, e cada vez menos opcional, desse novo paradigma.