Quando pensamos em um advogado corporativo, normalmente é a figura do contratualista que vem à cabeça, aquele que dá suporte aos negócios da empresa, analisa, estrutura e negocia os contratos, especialmente os de maior vulto e importância.
Porém, nem só de contratos vive uma empresa. Depois do contrato, sempre tem o processo.
Eu costumo dizer que quanto maior o contrato, maior a demanda, maior o potencial de discussão do contrato, e, em um país altamente judicializado como o nosso, sabemos que o número de demandas que vamos ter é sempre grande. Vivemos ainda num tempo em que as soluções amigáveis ou alternativas de litígios ainda engatinham, apesar das tentativas de incluirmos iniciativas como mediações e dispute boards nos contratos. Assim, a resolução de conflitos no judiciário e pela via arbitral ainda é a opção mais utilizada, apesar dos problemas.
O Advogado Contencioso Corporativo é o responsável por toda a gestão da carteira de processos, que pode ser maior ou menor conforme as características da empresa, que tipo de negócio a empresa desenvolve, se é B2B ou B2C, e isso faz toda a diferença, já que a primeira costuma ter muito menos processos em valores mais expressivos, enquanto a segunda, um número muito maior de processos menores.
Isso muda tudo, a forma de gestão dos escritórios, de provisionamento dos processos, relacionamento com a auditoria, descentralização dos próprios casos dentro de casa e ainda, o quanto o advogado corporativo se envolve com o processo em si.
Carteiras de processos menores permitem que o advogado se envolva na estratégia dos casos, sendo não só um “Gestor de Carteira” (que ele sempre será, não importa o tamanho), mas um verdadeiro estrategista dentro do contencioso, participando junto com o escritório especialista e com a área de projetos das decisões a serem tomadas, qual melhor caminho a ser seguido.
Além disso, é imprescindível que o advogado contencioso corporativo esteja sempre lá disposto a explicar os meandros do judiciário, todas as palavras difíceis e incompreensíveis às áreas de negócio, justificar os prazos longuíssimos e ainda, lidar com a ansiedade do cliente interno que se vê sem poder concluir seu projeto por uma liminar fora de hora…
Porém, quem ainda pensa no Advogado do Contencioso como aquele que “apenas” faz a gestão, recebe os processos, manda pros escritórios, analisa e provisiona os valores junto com o financeiro, acompanha indicadores e faz o acompanhamento dos casos (o que já é um trabalho imenso…), está perdendo a chance de participar da estratégia da própria gestão do projeto.
Isso porque TODOS os projetos de todas as empresas mais cedo ou mais tarde vão ter algum problema (quanto maior o contrato, maiores as demandas, lembram?” e um relacionamento estreito com as áreas antes mesmo da judicialização do assunto permite que a estratégia processual a ser colocada em prática seja definida ainda antes de se tomar decisões que podem complicar a situação -ou não- e muitas vezes se evite demandas mais complexas. Por isso a importância de se acompanhar os projetos desde o início, ou ao menos, desde o início dos problemas.
Isso é especialmente verdade em empresas de projetos de infraestrutura, como a que eu atuo, em que os projetos são sempre imensos, envolvendo uma quantia enorme de dinheiro, extremamente longos, e exigem o relacionamento com um número expressivo de fornecedores, que nem sempre cumprem seu papel à risca, além, é claro, de clientes que em sua maioria, são empresas tambem enormes e cheias de complexidades (muitas vezes entes públicos e todas as suas particularidades).
Assim, é durante a execução de um contrato que os principais riscos aparecem. Quanto um fornecedor não cumpre sua parte, pode atrasar toda uma cadeia de fornecimento e demais execuções, gerando um risco imenso não só financeiro, mas também de imagem à empresa. Um atraso significativo em uma obra pública pode render multas em valores elevados, desgaste com órgãos de controle e danos irremediáveis à imagem de uma companhia.
Todo esse envolvimento com as questões “pré-judiciais” certamente vai tornar a via pós judicialização mais fácil, com um caminho já traçado, pelo menos em relação à estratégia, claro, porque se formos levar em consideração as dificuldades do judiciário ou das arbitragens, aí, bem, é assunto pra outro artigo, ou vários…

Beatriz Mascarenhas
Advogada corporativa, atua em empresas, maiores ou menores, nacionais ou multinacionais, há 25 anos, sempre no contencioso. www.linkedin.com/in/beatriz-mascarenhas