Inovação no mercado jurídico

Inovação no mercado jurídico é muito mais do que apenas buscar vantagem competitiva utilizando as novas tecnologias disponíveis no mercado. Inovar requer mudanças e quebras de paradigmas, ou seja, adaptar-se à uma sociedade com novas formas de relações pessoais e profissionais e, principalmente, pautada em uma Nova Economia. 

Ao compararmos o mundo atual com o de dez anos atrás, é evidente como a  evolução tecnológica impactou a forma como as pessoas interagem e se relacionam. As tecnologias disruptivas moldaram uma nova sociedade, reinventando o mercado e desestabilizando o status quo até então existente.  

O surgimento de empresas como “Uber”,“Netflix”, “IFood” e “Open AI” trouxeram mudanças rápidas e tão significativas que o mercado ainda está aprendendo a lidar com seus efeitos. Termos como “uberização dos serviços”, “discriminação algorítmica”, “economia gig”, “vazamento de dados” e “fake news” são alguns dos conceitos emergentes na era digital e que levantam uma enorme discussão jurídica. 

Profissões foram extintas e outras novas surgiram, empresas gigantes quebraram enquanto pequenas empresas ascenderam, novos modelos de trabalhos foram criados sem a devida regulação, empresas com modelos de gestão tradicionais já não conseguem mais acompanhar o crescimento acelerado de empresas de tecnologia e a velocidade da disrupção que estão causando.

Nesta toada, o mercado jurídico está se transformando radicalmente para se adaptar à realidade desta “Nova Economia”: com a criação de leis, normas e regulamentações para atender às exigências contemporâneas; inovando na gestão de escritórios e forma como os serviços jurídicos são entregues; e incentivando mais o desenvolvimento de legaltechs

Este movimento reflete em quatro macro tendências principais que estão remodelando o nosso setor:

1. Nova Abordagem na Gestão e Cultura Organizacional dos Escritórios:

  • Gestão Descentralizada: A descentralização das decisões tem mostrado impactos positivos na satisfação e na retenção de talentos. Escritórios que adotam essa abordagem tendem a ser mais adaptáveis e inovadores.
  • Flexibilidade e Novas Contratações: A pandemia acelerou a flexibilidade e trouxe o trabalho remoto como uma prática viável, promovendo uma maior conciliação entre vida pessoal e profissional, incentivando também a contratação de talentos residentes em outras localidades. 
  • Multidisciplinaridade na Equipe: A contratação de profissionais estratégicos e “não advogados” (como RH, marketing, comercial e tecnologia) tem se tornado uma prática implementada por escritórios que buscam vantagem competitiva frente a seus concorrentes.

2. Tecnologia e Inovação

  • Inteligência Artificial (IA): Plataformas que oferecem serviços como revisão de contratos, compliance e gestão de litígios através de algoritmos estão transformando o dia a dia dos profissionais.
  • Blockchain: Esta tecnologia está revolucionando a forma como as informações são geridas e as transações são realizadas, oferecendo maior segurança e transparência.
  • Softwares de Gestão de Clientes: Ferramentas avançadas de CRM estão ajudando escritórios a melhorar o relacionamento com clientes, otimizando a gestão de contatos e facilitando o marketing jurídico.

3. Novas Legislações e Especialização do Conhecimento Jurídico

  • Inovações Legislativas: Novas leis estão constantemente surgindo, exigindo que os profissionais jurídicos se mantenham atualizados e adaptáveis para lidar com essas mudanças. 
  • Especialidade Técnica: É crescente a especialização dos advogados em mercados potencialmente aquecidos, como: LGPD, ESG, Criptomoedas e Tokenização, Startups e Inteligência Artificial. 

4. Governança Corporativa

  • Transparência e Sustentabilidade: Discussão para implementar práticas de negócios que reforcem a transparência e incentivem o crescimento sustentável e ético. 
  • Compliance e Regulação: A importância do advogado como parte integrante das estratégias de compliance dentro das empresas e startups.

A cultura da inovação tornou-se um elemento essencial para os profissionais de Direito que desejam se destacar no mercado jurídico e, nos últimos anos, já é possível evidenciarmos os resultados desta inovação na prática. 

Sob a perspectiva da Nova Economia, grandes firmas de advocacia (“big law”) estão cedendo terreno para escritórios menores. Estes últimos, ao incorporar a inovação como uma vantagem competitiva fundamental, estão redefinindo o cenário jurídico, mostrando que a adaptabilidade e a agilidade são tão cruciais quanto a escala e o alcance para competirem e prosperarem no ambiente jurídico atual. 

Em um ambiente de constantes mudanças, é necessário que profissionais do Direito estimulem habilidades além das suas competências técnicas (hard skills e soft skills) para acompanhar as tendências do mercado e ter uma reação positiva ao futura da prática jurídica no Brasil.


[1]  A “uberização dos serviços” refere-se ao modelo de negócios popularizado pela Uber, que utiliza plataformas digitais para conectar prestadores de serviço com clientes. 

[2]  A discriminação algorítmica ocorre quando sistemas baseados em inteligência artificial (IA) ou algoritmos produzem resultados que sistematicamente favorecem ou prejudicam um grupo de pessoas em comparação com outros, com base em características protegidas como raça, gênero, idade ou orientação sexual.

[3]  Refere-se ao mercado de trabalho caracterizado pela prevalência de contratos de curto prazo ou trabalhos freelancer em vez de empregos permanentes.

[4]  A disseminação de informações falsas ou enganosas, apresentadas como notícias, geralmente com o intuito de influenciar opiniões públicas, manipular fatos ou ganhar vantagens políticas ou financeiras. 

Rafaela Zandavalli

Advogada de empresas de tecnologia, sócia do escritório Mapz.Law, possui LLM em Direito Empresarial pela FGV; Certificação da Berkeley Innovation Acceleration Program; Governance Officer (IBGC); Pós Graduação em Legal Tech: Direito, Inovação e Startups; e Master em Governança (GoNew). Atua como Investidora Anjo, board de Conselho Consultivo, Mentora do InovAtiva e Cofundadora do coletivo Ser.A.CEO.

VOCÊ TAMBÉM PODE GOSTAR DE: