O E-ESG reverso e a advocacia corporativa

Há alguns anos a advocacia (especialmente corporativa) percebeu que a temática da sustentabilidade corporativa plena – que justamente propõe empresas, negócios, produtos, serviços, fluxos da cadeia produtiva e de valor, e formas de atuação empresarial mais sustentáveis (para que dessa forma, e através de escolhas, decisões, e estratégias melhores, ganhem mais dinheiro e valham mais) envolvia uma nova realidade, e uma nova questão para todos nós; e passou a estudar e a conhecer mais sobre esse contexto.

Além de ser uma realidade, esse tema demanda adaptações gerais, inclusive para a advocacia, e é nessa linha que propomos alguns pontos chave ao longo deste breve artigo.

Se de um lado a questão E-ESG afeta a advocacia, e exige ajustes (nos pequenos e nos maiores aspectos), de outro podemos e precisamos ajudar a própria temática. E neste texto abordaremos alguns desses pontos e proporemos algumas reflexões e ajustes em nossa atuação.

De início, tivemos grande resistência por parte de setores da advocacia, que demoraram a entender que o maior tema corporativo da atualidade precisava ser entendido por todos (que de alguma forma atuam com e para empresas, de forma direta e indireta, pois essa grande “revolução” na forma de se estruturar e implementar negócios afeta toda a economia, toda a sociedade), incluindo operadores do Direito.

Existem temas no universo corporativo que atraem ou repelem parceiros, justamente na mesma medida em que entendem as questões e passam a ajudar as organizações, ou que (de outro lado) já não se adequam ao novo modelo, e com o tempo são afastados “do jogo”.

No contexto atual, tanto local quanto globalmente, estamos cada vez mais conectados e interconectados, influenciando e sendo influenciados por tudo, por todos e o tempo todo, de forma que seria ingênuo imaginarmos que a advocacia não viesse a ser influenciada e impactada pelo E-ESG, e que com ele não viesse a se relacionar (impactando-o).

Com uma concepção de negócios e estratégias de atuação empresarial mais sustentáveis, grande parte da antiga “lógica” corporativa está sendo revista, e formas mais modernas, responsáveis, e sustentáveis de se operar e ganhar dinheiro estão em curso.

Evitemos as polarizações e os aspectos políticos que por vezes são trazidos erroneamente para esse tema, pois é sabido que todos precisamos aprender a lidar com ele, e que simplesmente negar essa realidade não será “o caminho”.

Com o tempo, teremos legislações, decisões de autoridades, pressões internacionais e de mercado, dentre outras, que crescentemente definirão ainda mais o papel e a magnitude de cada um (como indivíduos e como categoria profissional), mas essa jornada já está em curso – e quem não perceber o movimento (no estágio atual, e no que “vem por ai”) perderá a oportunidade de ajudar; mas também pode ser afastado do processo.

Esse cenário abre portas para novas e mais maneiras da advocacia se relacionar com as empresas, de apoiar os negócios, os investidores, os gestores, os executivos e todas as organizações de forma geral, e de ajudar a tomar decisões – uma vez que a sustentabilidade passou a integrar tudo o que as empresas fazem, as maneiras como fazem, e como tudo isso é documentado e refletido em estruturas, políticas, documentos, contratos, decisões empresariais, processos etc.

Dessa forma, mais e mais os departamentos jurídicos e os escritórios de advocacia criaram (e tem criado) formas de lidar com a nova realidade, desde a criação de áreas e/ou de setores mais focados e especializados até a reorganização das instituições como um todo, para que todas as áreas passassem a ter esse novo “olhar”; em tudo o que fazem.

De um “jeito” ou de outro, atual e felizmente, já quase não se encontra organizações e departamentos jurídicos que não estejam de alguma forma envolvidos na temática da sustentabilidade corporativa plena; de maneira que é natural, previsível e positivo que passem a cobrar uma nova mentalidade, uma nova visão, e uma nova postura da advocacia – tanto em termos de estrutura e de atuação dos escritórios, quanto no tocante ao próprio apoio jurídico, ajudando as empresas a incluir a sustentabilidade em todos os temas, movimentos, iniciativas, áreas e questões.

Já se observa que mesmo os escritórios que não criaram áreas ou setores para lidar diretamente com o tema, já se movimentam para que todas as suas áreas conheçam mais dessa realidade e consigam ajudar em suas respectivas atuações, no dia a dia.

Constatada essa realidade, propomos que consideremos mais dois aspectos da relação da advocacia com o E-ESG, notadamente no que somos afetados e impactados, e no que podemos influenciar, além do serviço jurídico propriamente dito.

No primeiro aspecto, destacamos que é importante que a advocacia corporativa (como um todo) acompanhe o desenvolvimento da questão da sustentabilidade, pois um dos pilares do tema é decorrente da ampliação do papel de cada organização nesse contexto.

Em outras palavras, além de reverem suas próprias práticas, estratégias e modelos de negócios, abraçando a sustentabilidade corporativa plena em seu “core business”, melhorando-o continuamente, as organizações precisam influenciar positivamente seus parceiros, para que também eles sejam melhores e mais sustentáveis. E, para tanto, crescentemente se espera das organizações que passem a considerar parceiros melhores, mais conscientes e mais sustentáveis.

Nessa linha, fornecedores de forma geral, parceiros de toda ordem, prestadores de serviço etc., e no nosso caso, inclusive a advocacia, já estão sendo demandados a serem, também eles, mais sustentáveis de uma forma geral, em todos os pilares E-ESG (englobando, por exemplo, aspectos ambientais como eficiência no uso da energia elétrica e da água, de suas instalações, redução das emissões de carbono, banimento de utensílios e produtos de origem não sustentável, redução do uso do plástico e dos derivados de petróleo de forma geral, dentre vários outros, e no aspecto social os desafios são ainda maiores como a efetiva inclusão de todas as pessoas, com todas as suas diversas características, fomento da economia circular, criação de mais oportunidades, maior acessibilidade e mobilidade, compreensão de necessidades específicas e “diversas”, percepção de efetiva diversidade nas equipes, cuidado com a saúde dos colaboradores, especialmente a mental etc.).

Torna-se bastante simples, e rápido, perceber que essas questões já chegaram, e que serão cada vez mais presentes nos departamentos jurídicos das empresas, e nos escritórios de advocacia – que em todos os casos serão (e de fato precisarão ser) ajustados para essa nova realidade. E já se nota diversos movimentos nesse sentido.

Propomos e sugerimos, assim, que toda a advocacia avalie a sua própria estrutura e forma de atuação, para passar a incluir em sua estratégia e modelo de trabalho todos esses temas. E não apenas por ser o correto a ser feito, mas para que estejam, também, alinhados com a maturidade corporativa atual.

Quem não se adaptar e não quiser rever seus processos, fluxos e políticas, corre o risco de rapidamente não ser mais convidado para trabalhar com (e para) as empresas mais sustentáveis.

Este artigo pretende ser, portanto, um alerta, e um convite a toda a advocacia, para que una seus esforços e “faça a sua parte”.

Mas pretendemos, também, chamar a atenção para um segundo aspecto, qual seja o que chamamos de E-ESG reverso, que neste contexto aborda o que a advocacia pode (e deve) fazer para influenciar positivamente as empresas nessa jornada pela sustentabilidade.

Da mesma forma como somos (e seremos continuamente mais e mais) demandados a nos ajustarmos, podemos e devemos influenciar também. E de mais de uma maneira, pois tanto podemos/devemos passar a considerar em nossas consultas, memoranda, orientações etc., questões de sustentabilidade, podemos e devemos, também, chamar a atenção (de forma positiva) para tendências e questões que talvez nossos clientes não estejam considerando.

Por fim, e de forma ainda mais ousada, propomos que também, a advocacia avalie o seu papel como influenciadora nesse processo, no sentido de também ela rever seus critérios de contratação de fornecedores e de parceiros, para que também esses sejam positivamente afetados e impactados pelo E-ESG.

Em algum momento, é esperado, inclusive, que a advocacia passe até mesmo a decidir pelo seu afastamento de negócios e de organizações que não sejam sustentáveis, que não se identifiquem com seus códigos de ética e de conduta, com suas políticas de “compliance” e de sustentabilidade – e que não se adaptem para atuar de forma mais moderna, responsável e consciente. Sendo que nesse sentido, passar a estabelecer, também ela (advocacia), critérios e políticas para atuar junto a empresas (realizando escolhas melhores).

Como a jornada é de todos, precisamos entender rapidamente o nosso papel, em cada caso, e as novas formas de atuar positivamente.

O que ainda é um sonho e uma proposta, pode passar a ser realidade rapidamente, a depender, também, da advocacia corporativa.

Leonardo Barém Leite é sócio sênior do escritório “Almeida Advogados” em SP, especialista em Direito Societário e Contratos, Fusões e Aquisições, Governança Corporativa, Sustentabilidade e ESG, “Compliance”, Projetos e Operações Empresariais, e Direito Corporativo; também é árbitro, professor, conselheiro, e autor de diversas obras. Presidente da Comissão de Direito Societário, Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.

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