O futuro do Direito e o Direito do futuro

Tanto a advocacia quanto o próprio Direito são “conhecidos” por serem formais, tradicionais, conservadores e até burocráticos, mas essa “imagem” está sendo descontruída, e atualizada, há algum tempo, e “felizmente” algumas áreas e setores já são bem mais flexíveis, “contemporâneos”, objetivos e até informais, como por exemplo o direito corporativo (e a advocacia corporativa).

Da mentalidade ao linguajar, da vestimenta ao estilo dos documentos e das reuniões, da informalidade no “trato” e na comunicação, “muita coisa já mudou”, assim como nos memorandos e mensagens mais curtos e diretos, que em seu conjunto levaram à uma nova forma de atendimento e de trabalho, e uma outra relação custo benefício, por exemplo; e essa questão tende a mudar muito mais.

Atualmente, portanto, já temos encontrado um “outro modelo” de advocacia, que abandonou diversos aspectos hoje considerados “antigos”, e foi sendo adaptado à realidade das empresas, e mesmo da sociedade atual, usando tecnologia, “softskills”, simplicidade, informalidade, mentalidade corporativa etc.

Se o direito e a advocacia atuais são (então) bem “diferentes” do que já foram, e de certa forma mais “modernos”, é natural que precisemos “conversar” sobre o que estamos construindo, e como acreditamos que venha a ser o Direito do Futuro, e a nossa atividade nesse mesmo “futuro”. E esse tema é doméstico, até por conta da questão da jurisdição, mas também internacional, pois o mundo é cada vez mais conectado, e globalizado, e a realidade (assim como acordos internacionais, diretrizes, normativas etc.) demanda que sejamos (especialmente em algumas áreas e temas) “mundiais” (no sentido de que precisamos ter noções, contatos e apoios relativos a outros países, legislações etc.)

Temos, por exemplo, teóricos e escritores que já há algumas décadas preconizam o “fim da advocacia”, e tantos outros até o fim das carreiras jurídicas em geral (inclusive no Judiciário), por conta de uma visão que acredita que “seremos todos” substituídos” pela tecnologia de forma geral, e ainda pela automação, pelos robôs e algoritmos, e pela Inteligência Artificial.

Sabemos que, em certa medida, as dimensões temporais são “um tanto relativas”, e que diversos aspectos e questões do passado, do presente e do futuro se interrelacionam, de maneira que “boa parte” do que vivenciaremos daqui a alguns anos já pode ser antecipada agora. Inclusive pelo fato de que na maioria dos aspectos e casos, tratam-se, na verdade, de “processos”. Sem contar que temos agora 6 (seis) gerações convivendo, numa realidade jamais vista, com desafios e oportunidades, que demandam conhecimento e respeito às diversidades naturais que o contexto vem criando.

Essa realidade de termos seis gerações simultaneamente no “mercado”, da Silenciosa à Beta, precisa ser entendida, respeitada, aceita, acolhida, e “aproveitada”, pois se temos muitos desafios, uma vez que a convivência não é fácil, é preciso que saibamos “aproveitar” o melhor de cada geração e de cada perfil, para que não apenas consigamos um bom ambiente e uma boa relação no trabalho, mas também entender essas mesmas seis gerações como parceiros e clientes.

As gerações “mais novas”, tem não apenas uma nova forma de pensar, de agir e até de ser, como também uma nova relação com o próprio trabalho – que tem uma nova/outra dimensão e espaço “na vida” deles. E há muitas consequências, que precisam ser consideras e entendidas, nas equipes e nas organizações.

Os sonhos, as vontades, as metas pessoais e profissionais, o “lugar do trabalho” e a forma de se relacionar com o tema, com as pessoas, e com as organizações, é cada vez mais diversa, e desafiadora. A maneira de trabalhar, de treinar, de orientar, e mesmo de ajudar, é bem complexa, e poucos de nós de fato sabemos nos relacionar no ambiente “de hoje”. Provavelmente, não apenas as relações profissionais e de trabalho precisem ser ajustadas, como as próprias carreiras e sua progressão.

Qualidade de vida, saúde mental, flexibilidade e liberdade, respeito á diversidade, mais espaço para a “vida pessoal e a social”, dedicação e lealdade, compromissos e relações de mais longo prazo, e o uso de “muita” tecnologia, além de interação digital são alguns dos aspectos que as “novas gerações” nos trazem.

Como esse tema (ou provocação) se comunica com o Direito (no caso brasileiro, mas também em termos mundiais), e como já podemos antecipar o “futuro do direito” e o “direito do futuro”?

Muita gente dirá que o “futuro é agora”, e que se “a colheita depende da plantação”, de maneira que já podemos (sim) antever o “que nos espera” (ou o que estamos construindo). Mas será que sabemos mesmo? O dinamismo atual ainda permite que se ”conheça” o futuro desde já?

Em grande parte o Direito (e a advocacia) é bastante tradicional, com sistemas jurídicos complexos e “bem-marcados”, notadamente o “continental” (ou romano germânico”, ou codificado, ou “civil law”) do qual “deriva” o direito brasileiro, e o “common law” (ou “britânico”, ou baseado em costumes e na jurisprudência), e essas “tradições” e marcos, tanto jurídicos quanto culturais, fazem com que as “bases” do direito sejam bem profundas e “pouco” se alterem.

Logicamente, o Direito evolui ao longo do tempo, novas leis e interpretações surgem, e ainda que em geral de forma lenta, o Direito acompanha o que “cada sociedade” tem como valor e visão de mundo, acrescentando regulamentações, criação de direitos, proteções e deveres. E temos cada vez mais “interconexões e interseções” entre os sistemas jurídicos.

Atualmente, porém, essas “evoluções naturais” são muito mais rápidas, complexas, dinâmicas e polêmicas, por razões e questões culturais, comportamentais, geracionais, locais, geopolíticas, tecnológicas, e tantas outras que influenciam legislativos, judiciários, agências e autoridades governamentais, e a advocacia.

Nesse contexto, e “focando no Brasil”, é inegável que ainda precisamos (e provavelmente precisaremos por bastante tempo) estudar, por exemplo, o Direito Romano e todos os “clássicos”, as bases de nosso sistema, e a própria história do nosso direito, bem como nossa legislação e jurisprudência, também cada vez mais dinâmicas; mas o foco deste artigo é provocar uma reflexão maior, sobre o “futuro” (da forma como o vemos e conseguimos antecipar neste momento).

Já vivemos uma realidade muito (muito) diferente do que vivíamos no começo da década (sem contar uma possível, e natural, comparação desta com a da “virada do milênio”) em que várias das tarefas e funções jurídicas ainda eram desempenhadas por pessoas humanas, de forma presencial, e com a tecnologia “apenas” como apoio e ferramenta.

Hoje as questões menos complexas, as tarefas mais burocráticas, padronizadas e repetitivas já nem são alocadas a pessoas, o relacionamento (se é que ainda podemos denominar sempre dessa forma) é digital/eletrônico, e “muita coisa” é realizada por sistemas/softwares, robôs, algoritmos e assim por diante; sem considerar “pesquisas”, “modelos”, minutas de documentos e peças processuais etc.

Essa “tendência” já muda “muita coisa”, nos departamentos jurídicos das empresas, nas “repartições públicas”, no Judiciário, nos escritórios de advocacia e “assim por diante”, o que demanda uma “enormidade” de ajustes, adaptações e atualizações em todos os operadores do direito. E muda a formação, o que se ensina/aprende nas faculdades, os estágios, os primeiros anos de cada carreira etc.

Precisamos conhecer mais sobre esse tema, sobre as tendências, as diversas demandas, inclusive geracionais como acima mencionados, e sobre a “nova” relação de humanos com a tecnologia, a automação e assim por diante, para que tentemos construir o futuro que “queremos” para o direito e para a nossa profissão, sob pena de nos tornarmos reféns do que “vier”, e sermos rapidamente desatualizados.

Escritórios, empresas etc. estão ajustando e alterando suas formas de trabalho, reaparelhando suas estruturas, treinando e sendo apoiados por equipes com “novos perfis”, e “novas características”, para desempenhar novas e outras tarefas e funções, que por sua vez precisam que as faculdades formem profissionais com conhecimento e competências que contribuam para esse novo cenário.

Reflitamos todos sobre esse tema (enquanto é tempo), e procuremos avaliar como estamos nos adaptando e adequando para atuar “no futuro”, e como são os profissionais que estamos treinando e preparando para esse momento. E como nossas estruturas e formas de trabalho precisam ser ajustadas, para que de fato sejamos protagonistas e construamos o futuro.

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