Do cross-selling ao cross-collaboration

Alguns temas são, historicamente, mais sensíveis de serem tratados pelos  escritórios de advocacia, e são comuns à grande maioria deles. Um exemplo notório é o cross-selling, a chamada “venda cruzada”, no bom português.

São constantes as discussões em torno do assunto, e também as frustrações pela falta de resultado, que, via de regra, tem como medida de sucesso a quantidade de áreas trabalhadas com o cliente, e o faturamento gerado a cada uma delas e ao escritório como um todo.

“Temos outras áreas para apresentar ao cliente?”

Quem já não ouviu ou fez uma pergunta como essa em uma discussão sobre cross-selling?

Preciso “levantar a minha mão”. Há não muito tempo atrás, também considerava esse questionamento, ou melhor, esse comportamento, como algo normal e estratégico na busca por desenvolvimento de negócios em escritórios de advocacia, até por se tratar de uma prática usual em outros mercados – mesmo para outros, a tal “venda cruzada” vem encontrando obstáculos por um consumidor cada vez mais consciente e exigente em suas decisões de compra. Mas, voltando ao nosso mercado, eis uma importante descoberta: o setor jurídico tem outra dinâmica de “oferta e compra” de serviços, o que impede que tenhamos sucesso na importação pura e simples do que é feito – muitas vezes, de forma amplamente validada – em outros segmentos.

Os possíveis erros e desvios das medições na história do cross-selling

O discurso pronto de simplesmente ofertar outras áreas aos clientes tende a continuar gerando nenhum ou pouco resultado, e a forma que medimos os resultados acaba por camuflar realidades de uma atuação multidisciplinar, por exemplo, que tem imenso valor, mas não pode ser confundida com cross-selling. Aqui, reside outro erro de análise no nosso setor. O cross-selling demandaria um esforço legítimo para ativamente promover outra(s) área(s) ao cliente, diferente(s) daquela(s) já trabalhada(s).

Mesmo quando algumas ou várias áreas do escritório atendem o cliente, comumente se mantém os silos organizacionais, com equipes trabalhando cada qual em seu “território” e, em casos ainda mais críticos, departamentalizadas dentro do próprio departamento. Ninguém sabe muito bem o que cada área tem feito para o cliente, porque tem feito e para o que tem feito. A importância de cada prática junto à empresa é geralmente medida pelo resultado de faturamento – não deixa de ser um indicador; longe de ser o único.

As diversas experiências e a expectativa do cliente

Para o cliente, a sensação é de estar trabalhando com diferentes escritórios, experimentando diferentes graus de satisfação e, consequentemente, diferentes experiências de marca. Um cenário frustrante de soma de diferenças na difícil estratégia de posicionamento e reforço de marca institucional, e extremamente arriscado na ainda mais difícil tarefa de fidelizar clientes.

Obviamente, esse modus operandi compromete a geração de valor da execução à entrega dos serviços. O cliente, sabemos, lida com necessidades cada vez mais complexas, em fina sintonia com um mercado que também está cada vez mais desafiador. Pensemos: se a dinâmica empresarial está há muito tempo interdisciplinar, como podem os escritórios pensar suas áreas isoladamente? A realidade é que o cliente espera que o escritório-parceiro entenda profundamente as suas necessidades e que entregue soluções que as atenda. É isso o que precisamos passar a medir: o quanto movimentamos e somamos as diferentes práticas e a administração dos escritórios para efetivamente entregar soluções e valor adicionado ao cliente.

Desenvolvendo negócios por cross-collaboration

Enquanto no cross-selling somos induzidos a pensar desenvolvimento de negócios sob a ótica de benefícios ao escritório, em que se enquadram áreas e serviços a serem promovidos por razões diversas, a orientação por cross-collaboration traz o cliente para o centro das nossas atenções. Desenvolver negócios passa a ser consequência de um exercício constante de organização pelo cliente, de querer ouvir e entender suas necessidades, acompanhar seu mercado, reconhecer riscos jurídicos ou não a que está exposto, e mesmo ter a predisposição para se somar a outros escritórios para a solução que o cliente precisa.

A verdade é que poucos setores de mercado são tão propícios ao trabalho colaborativo quanto o de serviços jurídicos, essencialmente para a atividade empresarial. Mas ainda é bastante difícil transpor as barreiras que dificultam essa rota de sucesso. Isso porque a prática do cross-collaboration desafia aspectos como cultura e modelos estruturais de muitos escritórios, como regras de compensação, o nível da “personalização”, o senso de “posse” individual sobre o cliente, entre tantos outros motivos.

Mas vale uma profunda reflexão sobre essa necessidade de mudança. Mesmo porque, tudo indica que é o melhor caminho para atrair e reter clientes.

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