Quando deixaremos de falar sobre violência e começaremos a discutir os direitos à felicidade e ao cuidado?

Por ser o mês da visibilidade lésbica e de conscientização pelo fim da violência contra as mulheres (agosto lilás), os desdobramentos das questões que permeiam as construções em torno de gênero e sexualidade ganham foco no mês de agosto. Todavia, graças à grande vulnerabilidade a que as mulheres são expostas cotidianamente, o direcionamento das lentes ainda é voltado para a violência.

Infelizmente, não há como ser diferente. Muito embora possamos notar o início de um debate, ainda que tímido, em torno dos direitos à felicidade, do cuidado e do desenvolvimento de políticas do bem viver (aqui, por mulheres negras e de forma mais avançada), graças às discriminações que ainda são propagadas e normalizadas na nossa sociedade, os espaços de discussão que se propõem a encarar os fatos, necessariamente, são ocupados pelos dados da violência.

Como já falamos aqui, gênero e sexualidade (assim como raça), são conceitos que foram forjados na construção das sociedades colonizadas e capitalistas, utilizados como instrumentos garantidores do sucesso do sistema colonial europeu. Desde então, é mantido um processo contínuo de reificação do corpo da mulher e do próprio direito, que há muito é utilizado como ferramenta para manutenção do status quo. Sim, o direito. O sistema de justiça.

Ora, nós vivemos em um país onde todas as formas de violência contra a mulher crescem absurdamente ano a ano e menos de 10% das vítimas procuram a polícia, basta conferir os dados lançados anualmente pelo Fórum de Segurança Pública. Sendo que nós possuímos um arcabouço legal protetivo invejável, a exemplo da Lei Maria da Penha que suscita o “agosto lilás” e reconhece as existências lésbicas.

Muito embora não possamos esquecer que ela foi criada em cumprimento à sanção imposta ao Brasil na condenação por omissão e negligência no caso de violência doméstica e familiar sofrida por Maria da Penha, é considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como umas das três leis mais avançadas do mundo na temática. Justamente por não apenas criar mecanismos de coibição da violência doméstica e familiar contra a mulher ou estabelecer medidas de assistência e proteção às vítimas, como também por sistematizar medidas de prevenção.

Todavia, advogadas e advogados que trabalham com o atendimento de mulheres afirmam que a implementação completa da lei não foi alcançada. Ou seja, ainda somos uma sociedade incapaz de proteger nossas mulheres e possuímos um sistema de justiça que impossibilita com que a transformação social seja operacionalizada pelo direito (como deveria ser).

Por isso a conta não fecha e qualquer argumentação que não admite o caráter estrutural (e estruturante) desta problemática tem origem em um pensamento hegemônico que tende a aumentar a distância entre o sistema de justiça e todas aquelas pessoas que precisam acessá-lo. Enquanto isso, mulheres unidas entre si, desenvolvem tecnologias de emancipação e autocuidado. De sobrevivência.

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